terça-feira, 31 de maio de 2011

COMEMORAÇÃO DOS 20 ANOS DA ECONOMIA DE COMUNHÃO

Ginetta Calliari, ao lado de Chiara Lubich, a fundadora do Movimento dos Focolares, deu a vida para que a Economia de Comunhão fincasse raízes.
Domingo passado, dia 29 de maio de 2011 – precedida por uma Assembléia de quatro dias, que contou com a presença de 650 empresários de 36 países dos cinco continentes – aconteceu uma Jornada com a participação de 1.600 pessoas, que lotaram o auditório Simon Bolívar, do Memorial da América Latina, em São Paulo.
Participaram do evento, empresários, trabalhadores, pesquisadores e estudantes de Economia, não só vindos de todas as regiões do Brasil, mas também de outros 14 países das Américas, da Ásia (Coreia e Filipinas), da África (Congo, Costa do Marfim, Quênia e Nigéria), bem como de 15 países da Europa Ocidental e Oriental. Todos reunidos no Brasil para celebrar os 20 anos da Economia de Comunhão (EdC), um projeto inovador lançado por Chiara Lubich exatamente no dia 29 de maio de 1991, em terras brasileiras, em resposta ao dramático quadro da desigualdade social materializado pela “coroa de espinhos” das favelas que circundam a floresta de arranha-céus da cidade de São Paulo.
Em 1991, quando Chiara Lubich visitou o Brasil, nosso país atravessava uma grave recessão econômica, com um índice de inflação que beirava os 500 por cento. Ao chegar a São Paulo, o impacto com as desigualdades sociais, visíveis pela extensão de favelas em discrepância com a selva de arranha-céus, inspirou-a a encontrar uma possível resposta para esse panorama dramático.
Em 29 de maio de 1991, diante de cerca de 650 pessoas do Movimento dos Focolares, reunidos na Mariápolis Araceli (hoje Mariápolis Ginetta, em Vargem Grande Paulista, SP), Chiara lançou a idéia amadurecida ao longo daqueles dias: “(...) fazer surgir indústrias, empresas, cujo lucro deveria livremente “ser posto em comum” com o mesmo propósito da primitiva comunidade cristã: ajudar em primeiro lugar os necessitados, oferecer-lhes trabalho, fazer com que não haja pobre em nosso meio. Depois, o lucro servirá para desenvolver as empresas e as estruturas para formar ‘homens novos’, porque, sem ‘homens novos’, não se forma uma sociedade nova!”
"A profecia", que nestes vinte anos "faz-se história" – como dizia o título do evento – suscitou o interesse de personalidades civis e religiosas presentes no auditório, tais como: o bispo auxiliar Dom Milton Kenan Júnior, representando a Arquidiocese de São Paulo; o xeique Armando H. Saleh, da comunidade islâmica de São Paulo; o reverendo Takayuki Nagashima, presidente do movimento budista Rissho Kosei Kai no Brasil; o secretário Eduardo Jorge, da Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo; e Fernando Leça, presidente da Fundação do Memorial da América Latina.
A Jornada não foi somente uma solene celebração, mas foi realizada a partir da reflexão sobre a crise econômica internacional, com o intuito de lançar um olhar para o futuro.
Durante a manhã, o economista Rubens Ricupero, reitor da FEC-FAAP (Faculdade de Economia da Fundação Armando Álvares Penteado) e atual secretário geral da Unctad (United Natios Conference on Trade and Development), fez uma análise lúcida e crítica sobre a situação econômica mundial.
Ricupero apresentou um panorama paradoxal: as economias mais ricas (EUA, Europa e o Japão) ainda estão imersas na difícil fase de superação da crise, enquanto, graças às economias dos países emergentes (China, Índia, Brasil, México e Turquia), “a economia mundial mantêm uma tendência de crescimento, mesmo diante das dificuldades de uma expansão econômica acelerada”, esclarece o economista.
Em relação às raízes da crise econômica mundial, Ricupero teceu considerações sobre o problema ético que desembocou “no domínio das finanças sobre a economia”, um sistema financeiro “fora de controle”, que favorece “o acúmulo de riquezas sem limites” por parte de alguns especuladores, “como se não houvesse implicações sociais”, afirma. Assim, ele afirma que a percepção corrente é que "o mercado é como um Deus onipotente, onisciente, com auto-regulação".
A socióloga brasileira residente na Itália, Vera Araújo, falou sobre os efeitos da "mercantilização global" que gerou "novas patologias sociais" como “a solidão, a ansiedade, a depressão, a insegurança e o medo". A pesquisadora discorreu ainda sobre interdependência, ou seja, uma responsabilidade que "se transforme em um guia das ações"; e sobre uma cultura do individualismo e do utilitarismo que deve se encaminhar para "uma cultura de doação que gera comunhão," capaz de "transformar internamente as relações produtivas e as estruturas de produção”. Não é utopia, mas realidade. Isso é demonstrado por centenas de empresas ao redor do mundo inspiradas na Economia de Comunhão e que se encontram inseridas na economia de mercado com o objetivo de “não enriquecer sem medidas os seus proprietários, mas servir ao bem comum e ajudar a sanar as feridas causadas pela desigualdades sociais”, como declarou em sua mensagem Maria Voce, atual presidente dos Focolares. Ela ressaltou que a EdC é o testemunho de um novo caminho na Economia, ressalta Maria Voce, definindo-a como “um dos sinais de esperança".
Refletindo sobre o significado da EdC no atual contexto econômico e na sociedade global, o economista Stefano Zamagni reconhece nela "um caminho para aquela nova ordem social que encontramos na encíclica Caritas in Veritate de Bento XVI, na qual afirma que a fraternidade é condição para o desenvolvimento humano".
O evento foi encerrado com a apresentação das perspectivas para os próximos 20 anos, pelo economista Luigino Bruni. O pesquisador destacou novamente a urgência de que o capitalismo se transforme, tendo na comunhão e na fraternidade as chaves para esta mudança na direção de uma economia voltada para o bem da comunidade planetária.

terça-feira, 10 de maio de 2011

CHIARA LUBICH SOBRE GINETTA CALLIARI

Cerca de um mês após a morte de Ginetta, ocorrida em 8 de março de 2001, Chiara enviou a todos os membros do Movimento dos Focolares um pensamento sobre ela, que transcrevemos por ocasião do 10º ano da sua partida desta terra.


Rocca di Papa, 19 de abril de 2001

A unidade mais genuína
Caríssimos,

Parece realmente que Jesus não faz economia em oferecer modelos para nossa vida cristã, a todos nós e, principalmente, aos jovens. Ele os apresenta justamente nesta época tão escassa de modelos; quando muito, eles são procurados por caminhos errôneos.
Nestes últimos dias, estamos conhecendo muitos detalhes da vida de Ginetta. Alguns podem ser considerados extraordinários. No entanto, será necessário um livro inteiro para conhecê-la, ainda assim, apenas parcialmente.
Será possível identificar nesta sua riquíssima vida espiritual uma qualidade ou virtude que mais a caracterizou?
Sim: a unidade – eu creio –, a unidade mais genuína, correta, autêntica, perfeita, forte, sólida, vivida e realizada com o amor exclusivo e perseverante a Jesus Abandonado. Aquela unidade que a nossa espiritualidade comunitária nos ensina a viver, seguindo o modelo da Santíssima Trindade; aquela unidade com a qual, na medida das nossas possibilidades humanas, procuramos repetir o relacionamento entre o Pai celeste e o seu Filho, no Espírito Santo.
Desde o início da sua nova vida, a partir do seu encontro com o Ideal da unidade, Ginetta compreendeu que Deus nos doou um carisma e o ofereceu a todos por meio de um instrumento seu. Dessa convicção provinha a sua unidade total e incondicional com aquela que, de certo modo, representava a fonte desse carisma.
Ela não se apoiava em si mesma, não se voltou para si mesma, nem sequer para o que possuía de mais precioso, ou seja, a luz deste dom do qual ela também participava. Ginetta viveu como Jesus que, mesmo podendo chamar a atenção para si (Ele também era Deus, como o Pai), não o fez. Jesus “apagou-se” a si mesmo, digamos assim, orientando a todos para o Pai.
Ginetta anulou-se completamente a si mesma e, assim como Jesus Abandonado, que, reduzindo-se a nada, foi Mediador entre nós e o Pai, também ela tornou-se uma autêntica mediadora do carisma da unidade para muitos.
Ela abriu espaço ao carisma da unidade genuíno. Não lhe quis dar uma interpretação pessoal. Acolheu-o assim como ele jorrava da fonte. E colocou-se a seu serviço, vivendo-o e levando os outros a viverem-no. Daí deriva a autenticidade da sua vida, o segredo, o milagre, a capacidade de concretização e o fato de realizar obras completas. Por isso é reconhecida por unanimidade como co-fundadora daquela porção da Obra que é uma parte do mundo: o Brasil. 
Que agora, do Céu, ela nos ajude a viver assim!
Ginetta viveu unicamente para a glória de Deus. Ela foi puro serviço, serva, como Maria. Não temos nada de melhor a indicar para sabermos como agir neste próximo mês: viver o nosso Ideal, assim como o Espírito Santo nos doa por meio do instrumento escolhido por Ele. Porque assim foi Ginetta.
                                                                                Chiara

segunda-feira, 2 de maio de 2011

GINETTA A EMPRESÁRIOS E AGENTES DA EDC

Propomos a seguir trechos de dois discursos de Ginetta dirigidos a empresários e agentes da EdC, em 1994 e 1996, e que podem servir de orientação e inspiração também hoje, passados 20 anos do lançamento da iniciativa.

“Quando Chiara nos comunicou essas suas ideias fascinantes [a proposta da EdC], os nossos corações exultaram. Para nós, era como canto do Magnificat, qual Carta Magna da Doutrina Social da Igreja, que Maria, como guia da Sua Obra, proclamava para desencadear uma revolução de amor.
A adesão dos membros do Movimento foi imediata, entusiástica, comovente; dos ricos aos pobres, dos pequenos aos grandes… envolveu a todos, provocando um germinar de vida nova, de projetos a serem atuados, de ideias… uma certeza adamantina, inabalável, que saciou todas as aspirações .
Cada um sentiu-se tocado e lançou-se numa contribuição pessoal das mais variadas formas. Vimos acontecer, de modo surpreendente, uma comunhão de bens como a dos primeiros cristãos: dinheiro, jóias, terrenos, casas, disponibilidade de tempo e de trabalho, disponibilidade de mudanças de cidade, oferenda a Deus de sofrimentos e da própria vida. Também as crianças organizaram várias atividades a fim de recolher fundos, permitindo-lhes serem protagonistas neste projeto. Até mesmo os mais necessitados deram a própria contribuição, o que para alguns significava dar mensalmente 50 centavos, para outros uma galinha… Era o óbolo da viúva atraindo bênçãos do Céu.
O povo brasileiro, que Chiara considerava “magnífico, generoso, simples, pobre, mas que doa tudo, inteligente, criativo e solícito”, soube responder ao apelo!
Com o desejo ardente de concretizar imediatamente esta inspiração, iniciamos a procura de um terreno que tivesse todos os requisitos de uma região industrial, ou melhor, que tivesse principalmente a “vocação” para garantir, no futuro, um Pólo no qual as empresas, por estarem instaladas num mesmo local, pudessem testemunhar essa nova economia. Nós, os responsáveis pelo Movimento no Brasil, fomos em peregrinação a um santuário pedir a Nossa Senhora essa graça… Depois de muita procura, a 4 km da Mariápolis Araceli, encontramos uma área pronta para esta finalidade.

Partindo das palavras de Chiara: "Somos pequenos, pobres, mas muitos", estudou‑se a possibilidade de constituir uma Sociedade Anônima, da qual todos pudessem participar, mesmo com um capital mínimo. Surgiu, assim, a ESPRI S.A., graças à competência, à generosidade e ao esforço – com sacrifícios – da parte de muitos membros do Movimento que se sentiram chamados pessoalmente a colaborar e a levar adiante esse projeto divino, conscientes de tal responsabilidade.
As iniciativas eram numerosas, às vezes, minúsculas, mas alimentadas, sustentadas e encorajadas pelas palavras de Chiara.
Depois da experiência destes anos, podemos afirmar que a geografia de Deus não é a mesma dos homens, porque Deus, ao escolher o Brasil, conhecia a trágica situação econômica do País. Abrir empresas num contexto social como o nosso, no qual milhares de fábricas estão fechando por causa da crise econômica, é humanamente absurdo, é contra a lógica humana…
A “cidade terrena”, que é o Pólo Industrial, completa, na inspiração de Chiara, a “cidade celeste”, que é a Mariápolis, constituída das instalações de formação e de testemunho do Ideal da unidade. Essa “cidade terrena” revela uma economia que desce do Céu, do coração da Trindade; portanto, não pode levar em conta somente os raciocínios meramente humanos, pois Cristo quer que vivamos de fé: "Tudo é possível àquele que crê" (Mc 9,23).
Podemos ainda compará-la com uma medalha: de um lado, uma realização, que é o Pólo Industrial, que se apresenta a todos como um testemunho concreto do Ideal da unidade; do outro, Jesus Abandonado, cujo amor por parte dos agentes da EdC é a raiz escondida que tudo sustenta. A espessura da medalha são as múltiplas experiências feitas de alegrias e conquistas, mas também de suspensão, de temores, experiências essas todas substanciadas pela vivência da Palavra de Deus.
Mas é preciso que a EdC vá em frente, para que realmente não haja nenhum necessitado entre nós. Essa é a vocação à qual somos chamados, como membros da Obra de Maria: viver no século XX como a primeira comunidade cristã de Jerusalém vivia. A nossa missão não se restringe a um trabalho de assistência aos pobres; somos chamados à comunhão, a partilhar tudo, como numa família.
Portanto, hoje, mais do que nunca, o futuro da EdC depende de cada um de vocês, empresários da comunhão na liberdade.
Não posso concluir essa minha exposição sem citar as palavras de Chiara: “O que fazer? Desanimar diante de um desafio tão grande? Com certeza, não. A Palavra de Vida nos diz: “Não temas, crê somente”. É isso que peço a mim mesma e a todos vocês: não temamos, continuemos a acreditar. Assim como Deus deu coragem àqueles que se comprometeram até agora, continuará a dá-la a muitos outros que talvez estejam esperando apenas por um impulso para lançarem-se nessa maravilhosa aventura.
Embora não nos sintamos capacitados, a fé em Deus fará com que ele manifeste a sua potência levando a Economia de Comunhão a um desenvolvimento inimaginável”.